segunda-feira, 10 de outubro de 2011

SE STEVE JOBS E WOZNIAK FOSSEM BRASILEIROS....


Steve Jobs cresceu em Mountain View, Santa Clara, Califórnia. Ali, junto com seu amigo Steve Wozniack fundou a Apple Computer em abril de 1976. Para financiar seu projeto, Jobs vendeu sua perua Volkwagen e Wozniak sua calculadora. A primeira sede da empresa foi a garagem da casa de seus pais. Foi ali criaram o primeiro computador, o Apple I. Venderam a ideia para os membros da Homebrew Computer Club. Com esse contrato, conseguiram o crédito necessário e entregaram o pedido do primeiro cliente dentro do cronograma estabelecido. Depois levaram a ideia a um industrial, Mike Markkula que deu a eles, sem garantia, a valor de  duzentos e cinquenta mil dólares em troca de um terço da empresa. Com esse dinheiro, Jobs e Wozniak lançaram o seu produto. As vendas chegaram a um milhão de dólares. Quatro anos depois a Apple abria suas ações na Bolsa.

Agora suponhamos que Steve Jobs tivesse nascido no Brasil. Pode ser em São Paulo mesmo. O nome dele seria Estevão Labuta. Não fez faculdade nenhuma. Tinha um amigo que se chamava  Elson Washington. Eram dois apaixonados por tecnologia, portanto dois nerds que sofriam bulling no bairro e todos diziam que eles eram kiwis. Peludos por fora mas frutinhas por dentro.

Mas eles tiveram uma ideia. Um computador que seria uma inovação no mercado. O problema é que não tinham um puto pra começar a montar a tal máquina. Se trancaram na garagem do Seu Labuta, pai do Estevão, e começaram a pensar em como conseguir a grana. Resolveram colocar o projeto no papel e tentar vender a ideia pra alguém financiar a compra dos equipamentos básicos.

Colocaram um anúncio grátis na revistinha do bairro, contrataram uns moleques pra distribuir folheto no farol e uma tias pra ficar encostadas no poste o dia todo com um cartaz pendurado no pescoço.
Ninguém abanou o rabo. Resolveram bater de porta em porta, tipo Avon, perguntando: Você gostaria de experimentar um computador revolucionário novinho? Finalmente um sujeito mais maluco que eles se interessou e disse: " Traz aí que eu experimento. Se gostar te pago em 3x sem juros, 30, 60 e 90 dias com cheque pré". 

Foi então eles tiveram que confessar ao sujeito que eles ainda não tinham o computador, só a ideia. E que precisavam de uma carta de interesse dele e de um pagamento adiantado pra comprar as peças e montar a traquitana.
Com pena dos dois malucos, mas como já foi sonhador um dia, o tal sujeito fez uma carta de interesse de compra que legalmente não valia uma banana e colocou, óbvio, o nome de um laranja e de uma empresa fantasma cujo endereço ficava na casa da prima da empregada, lá em Mocotó.
Finalmente, com aquele pedido de compra, lá foram eles pra Santa Efigênia tentar comprar fiado. Como garantia apresentavam a carta de interesse do laranja. Até o Ching Ling colocou os  dois pra correr. Não conseguiram sequer o adaptador pra tomadas novas.

Pra dar certo era preciso de um capital maior. Capital de giro. Ok, então que tal um empréstimo?
- A Crefisa não faz consignado! Gritou Elson igual aquela propaganda irritante que passa todos os dias na TV. Preferiram ir ao banco, afinal quando a esmola é demais até Estevão Labuta desconfia.
No banco não rolou. O gerente simplesmente disse que eles tinham que ir lá acompanhado dos pais para dar garantia. Caso contrário....niente.
Voltaram para a garagem. Enquanto pensavam numa solução, bateram na porta. Era a subprefeitura do bairro dizendo que falaram pra eles que ali estava rolando um empresa, um bar, alguma coisa estranha. Pediram para ver os documentos.

- Que documentos?  É' só um laboratório!
- Mas andam falando que vocês estão vendendo computador aqui.

A subprefeitura tinha sido acionada pelo dono da lojinha em frente, que estava achando que ia rolar uma concorrência por perto.
Sem documento algum além da carta do laranja que eles acharam melhor esconder, o fiscal chegou a conclusão que a garagem estava fora das regras de segurança, que tinha gato na parte elétrica, que faltava extintor de incêndio, que a linha de telefone era clandestina, que a privada estava com vazamento e precisava trocar o reparo em 24hs, senão rolava uma multa da Sabesp, e que eles tinham que pagar uma parcela de 1987 do IPTU que não tinha sido quitada até aquele dia.

- E cadê o CNPJ? É empresa simples, micro empresa ou S/A?

Os dois fizeram as contas e chegaram a conclusão que o prejuízo seria um pouco menor se rolasse um cascalho pro fiscal. E ficava tudo certo.

Dia seguinte. Bateram na porta. Era a empresa de telefone dizendo que constava no sistema que a linha telefônica naquele endereço tinha uma conta pendente. Só que a linha era do segundo andar da casa e não da garagem.  E no segundo andar morava um inquilino que no momento não estava e sabe-se lá quando voltava e como voltava. Conseguiram convencer o funcionário a ir embora prometendo que iriam no escritório central da tal empresa que ficava no centro da cidade e só atendia o público as quartas das 11.00 as 12.30hs. Mas na próxima quarta era feriado.....

Meia hora depois bateram na porta, de novo. Era a empresa de luz que tinha ido lacrar o relógio porque acusava no sistema um gato na fiação do poste até a casa. Labuta chama seu amigo cujo pai era ex eletricista aposentado da empresa, que convenceu, com uma graninha dos meninos, o sujeito a não dizer nada pra ninguém e fingir que não viu.

Dia seguinte. Os dois tentando achar um jeito com menos dinheiro ainda. Toca a campainha. É o corpo de bombeiros que veio saber se é verdade que ali não tinha extintor de incêndio. Acabaram descobrindo que também não tinha saída de segurança, seguro contra incêndio, placas indicando saída de emergência, plaquinha dizendo "antes de entrar no elevador verifique se o mesmo...

- Mas aqui não tem elevador!

- Então tem que colocar  a placa na escada alertando para o perigo do chão molhado.

- Mas não está molhado!

- Mas quando lavar vai ficar. Aliás quem limpa aqui? Tem funcionário? Ele usa a roupa de proteção apropriada? Tem carteira assinada?

O bombeiro foi embora mas deixou com ele duas coisas: uma lista de obrigações a fazer e a promessa de que voltaria em 7 dias para verificar tudinho.

No mesmo dia, à tarde, enfiaram um telegrama por baixo da porta. Era da imobiliária que alugava a casa para o pai do Estevão Labuta dizendo que o aluguel era residencial e que eles ficaram sabendo que ali estava rolando uma loja e que então tinham que cancelar o contrato e fazer outro, comercial, de no mínimo 5 anos com fiador com um imóvel quitado dentro do município e depositar um cheque caução no valor de 3 meses do aluguel, que seria reajustado.

A essa altura já tinha rolado tanta propina que não sobrou nem uma moeda do pouco que eles tinham pra comer um McLanche Feliz e completar a coleção dos Smurfs que estavam fazendo.
Mas o sonho continuava ali, firme.
Finalmente uma luz! O cara que testou o primeiro computador e pagou em 3x com cheque pré, curtiu a traquitana e queria mais um.
E agora?

BNDS taí pra isso! Tocaram pra lá. Levaram 45 dias pra conseguir falar com a recepcionista que marcou uma entrevista com eles pra 1980 e deu uma lista de documentos que nem até lá eles iriam conseguir juntar. Apelaram para o SEBRAI. Participaram de 5 palestras gratuitas com aquele moço grisalho que falava no Fantástico todo domingo, mas que não resolveu muito o caso deles.

Descobriram que existia uma lei de incentivo às micro empresas.
Descolaram um contador que tinha uns contatos no partido do governo e conseguiram convencê-lo, com um presente roubado do bar do pai do Washington, a entrar com um "pedido" de financiamento a fundo perdido de 10 mil reais, mas 25% tinha que parar era no fundo do bolso dele. Mérito.

Os dois saíram felizes da vida achando que o problema estava resolvido.
Mas naquela mesma tarde ligou o contador pedindo uma lista de documentos que ia desde Inscrição municipal, CNPJ, endereço, comprovante de residência, copia de RG e CPF com firma reconhecida até o número do sapato e marca da pasta de dente preferida. Isso além de um exame psicotécnico, certificado de reservista, comprovante que votou na última eleição e BO de antecedentes criminais.

E no dia seguinte quem apareceu? O bombeiro, pra saber se já estava tudo em ordem. A mãe do Estevão atendeu, enrolou o sujeito com um cafezinho e duas broas de milho e disse pra ele voltar outro dia que os meninos estavam de castigo.

Uma semana depois o contador ligou de novo e pediu mais uns documentos: comprovante de vacina de febre amarela, 3 fotos 3x4 com data e aconselhou os dois a se filiar ao partido pro processo andar em 125 dias, caso contrário....
Isso sem falar no "cascalho" que eles tiveram que passar pra documentação subir do terceiro para o quinto andar e chegar na mesa da pessoa certa.

A essa altura os dois resolveram pedir uma ajudazinha pros pais. Venderam uma moto velha do tio Wesley que tinha sumido há 3 meses e ninguém sabia se ainda estava vivo ou morto. Com esse dinheiro que ganharam no desmanche mais um troquinho do supermercado que a mãe do Washington liberou e a venda dos smurfs incompletos do Mc Donald's conseguiram abrir uma empresa com CNPJ, que levava 30 dias pra liberar. Foram num lugar estranho pegar uma tal de senha da empresa pra poder emitir nota fiscal, se registraram no INSS e pagaram as primeiras parcelas do GPS, do Cofins e do ISS.

Como a sede da empresa era no endereço da garagem, e com medo que voltassem os bombeiros, a empresa de água, de luz e de telefone, o melhor foi colocar o endereço da firma na casa da prima da empregada do laranja, lá de Mocotó. Beleza, uma empresa a mais uma a menos nesse endereço, ninguém ia notar. E o ISS era 6% e não 12%.

Nada de placa fora da garagem com o nome da empresa, apesar do logo que o cunhado do Elson fez ter ficado manero. Primeiro pra não ter que pagar aquele tal de CADAM e depois pra não chamar atenção de malandro.
Finalmente trabalharam duro na garagem. Dia e noite. Conseguiram montar o computador com umas peças originais, outras adaptadas, outras de segunda mão e até uma doação do Ching Ling, que não aguentava mais os dois enchendo o saco pedindo fiado, e doou um teclado velho depois que eles compraram uma "léplica do lelógio "Maikokor".

Por milagre conseguiram montar 10 computadores com a  ajuda de um boliviano clandestino que foi engenheiro da Petrobrás em Santa Cruz de la Siera.
Parecia que agora a coisa ia....mas eis que um dia bateram na porta da garagem. Novamente. Era o famoso Pé Preto, "miliciante", dizendo que se eles não comprassem o botijão de gás, assinassem a CabriNet e pagassem uma cervejinha pra ele aquela empresa ali não ia ter futuro não. Ao invés de computador eles iam é fabricar microondas com pneu de carro.
Estevão e Elson não sabiam o que fazer. Se fossem na Polícia denunciar o Pé Preto eles é que iriam acabar como dois sacis. Se não pagassem iam virar dois pockets lanche de microondas e se pagassem não teriam dinheiro pra continuar a montar os computadores.

Melhor pagar. Conseguiram negociar com o Boi Manso, tesoureiro do Pé Preto e assinaram o plano básico da Cabrinet, sem Telecine e HBO.

A essa altura o dinheiro do incentivo das micro empresas ainda não tinha chegado e o contador do partido sumiu depois de um escândalo que saiu na Veja.

A empresa de telefone começou a ligar todos os dias oferecendo um plano melhor.
A mãe do Washington deu um basta e disse que não ia mais gastar dinheiro fazendo broa de milho pro bombeiro que aparecia lá toda semana porque o marido tinha cismado que ela estava dando pro sujeito e já tinha dado um "cola brinco" na coitada.

O vizinho da frente, dono da lojinha,  que estava desconfiado que aquele entra e sai ia mesmo virar concorrência,  chamou a polícia e disse que estavam cavando ali dentro um buraco pra chegar lá na agência do Itaú.
A polícia invadiu a garagem, foi parar todo mundo na delegacia, os vizinhos se amontoaram achando que ali estava rolando um esquema estranho de conexão com ETs, ou desmanche de moto, cujo tio desaparecido voltou e deu queixa de roubo da magrela, ou então era coisa do Demo mesmo.

A essa altura, o pai do Estevão, seu Labuta, puto da vida com o barraco e a dor de cabeça na delegacia, teve  que provar que na garagem não rolava nada demais, que seu filho não era gay e que nunca tinha ouvido falar naquele contador que saiu na Veja. Em casa, deu um sarrafo no Labuta Jr, uns cascudos no amigo dele, Washington, limpou a garagem e alugou o espaço pra guardar carro, afinal era pra isso que servia.

Hoje, Estevão Labuta e Elson Washington trabalham como manobrista, cobram 10 reais por hora de estacionamento, lavam os carros dos clientes nas horas livres e nos fins de semana fazem uns bicos de Valet Clandestino na Vila Madalena.