quinta-feira, 29 de abril de 2010

5ª Feira - Dia de "HOMENS E MULHERES"



QUE VIAGEM




Entra no trem. Lotado.
Encontra uma poltrona vazia onde na sua frente está uma mulher. Ajeita as coisas, pega o jornal e antes de começar a ler da uma "scaneada" na companheira de viagem.
Estranha.
A princípio, bonita. Mais velha, talvez beirando os quarenta.
Deixa pra lá e começa a ler as manchetes. Nada de interessante que prenda a sua atenção a ponto de não perceber que sua vizinha não conseguia acomodar bem os pés. Olha para eles e vê um par de botas bastante exótico. Começa a subir e encontra uma calça jeans debaixo de um vestido de veludo, uma jaqueta por cima, uma echarpe bastante rústica, um colar e um lenço no pescoço. A princípio o look era de cebola. No limite entre o fashion e o bicho grilo.
Um livro no colo junto com um celular. Olhava pela janela sorrindo com seus pensamentos. Viu então suas mãos. Susto. Enormes. Bonitas mas exageradas. Pensou por um minuto em se tratar de um travesti. Depois, discretamente observou os detalhes e viu que elas eram proporcionais as suas pernas que eram proporcionais aos seus pés. Com certeza um mulherão!
Voltou a sua leitura mas ao mesmo tempo pensava naquela mulher. Como seria? Geralmente as meio bicho grilo são interessantes, inteligentes. O que ela faz? Onde estaria indo?
E aqui começou a sua viagem….
Trocou o jornal por um livro. Crônicas da literatura brasileira. Mas a sua atenção era nela. Viu que ela ligou para alguém e descobriu para onde ela ia mas não conseguiu entender muito bem fazer o que. Parecia que ia encontrar alguém. Mas pelo menos iam para a mesma cidade.

A esta altura a viagem dele fluiu. Ela era com certeza inteligente, meio artista, talvez pintora, atriz ou fotógrafa como ele.
E ela olhando a janela. De repente se vira e pede a ele o jornal emprestado.
Esta tentando puxar conversa? Não se sabe.
Enquanto ela lia ele ficou ali, delineando toda a sua vida, o seu estilo, a sua personalidade. Um rosto um pouco marcado mas bonito. Começou a pensar nos filmes onde as pessoas se encontram assim, por acaso, e se apaixonam e vivem histórias de amor as vezes para sempre, as vezes não.
Foi então, quando ele já tinha desenhado a sua deusa na cabeça e já estava quase convencido de que aquela mulher talvez fosse a sua alma gemea que ele sempre achou que encontraria assim, por acaso, como nos filmes, que ela termina de ler o seu jornal, coloca na poltrona ao lado, sequer agradece e telefona para um tal de Marcos. Ele disfarça mas escuta quando ela diz que ligou pra ele só para dar um oi. E repete isso umas três vezes, já meio nervosa. E então sua quase Deusa começa a virar uma mulher de carne e osso, talvez carente, talvez até disponível demais. E o seu filme se interrompe. Intervalo para os comerciais. Vida real.
Será que ela é do tipo de mulher que pega no pé? Este Marcos pelo visto não gostou muito deste telefonema que não disse nada. Dá pra ver que ela ficou meio sem graça.
Agora é o celular que toca, ela atende mas a bateria acaba. Desespero, total desespero. Chega a falar sozinha. Reclama e deixa o aparelho aberto, ali, na sua frente, em cima da mesinha. Olha para ele em pânico. Toca de novo. A bateria fracassa novamente. Sem jeito, ela olha pra ele e diz:

- Acabou a bateria….

Como pedindo: pelamordedeus me empresta o seu celular?
Ele finje que não ouve nada e continua grudado no seu livro. Desiludido, completamente desiludido.
Minha quase Deusa durou pouco. Esse mulherão, alias olhando bem ela nem é tão bonita assim é carente como eu! Um idiota que vê uma mulher na frente e como não tem ninguém de interessante em quem pensar, fica viajando numa pessoa que nem conhece!

E só pra completar a desilusão ou cair na realidade de vez ela pergunta de repente, angustiada, se ele não tinha , por acaso, um cigarro.
Minha deusa fuma!!!
E não só fuma como depois, já na plataforma, enquanto atendia o celular, ele viu ela jogar a bituca no chão, pisar em cima e sair andando, com sua bolsa, seu celular sem bateria e o meu jornal!

1 comentário:

  1. Helena, esse texto me rendeu o fechamento das centenas de gargalhadas que dei hj com seu livro. Ele me fez o milagre de não dormir no Ônibus da empresa, nem na ida, nem na volta. Parabéns pelo livro, pela acessibilidade e pelo blog tbem. Aliás escrevi um post "Mãe merece ser ouvida" por causa de vc. www.papelux.blogspot.com Virei fã.

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